Ecos Literários: Reflexões Contemplativas e Sustentáveis - Volume 2

Abstract

No princípio era o Verbo, e o Verbo estava com Deus, e o Verbo era Deus. Ele estava no princípio com Deus, e a tarefa do monge fiel seria repetir cada dia com salmo diante humildade o único imodificável evento cuja incontroversa verdade se pode asseverar. Mas vivemus num per speculum et in aenigmate e a verdade, antes de face a face, manifesta-se por traços (ai, quão ilegíveis) no errar do mundo, de modo que devemos decifrar-lhe os sinais fiéis, mesmo onde nos parecem obscuros e quase tecidos de uma vontade de todo tendente ao mal. A atual e recorrente temática da polarização faz-nos entrever um silêncio denso, um mutismo inédito, marcado pelo fechamento ao outro e ao transcendente, como se o diálogo e a escuta tivessem sido suspensos. Nesse cenário, a Literatura surge como um espaço de ressonância, um eco que atravessa o tempo e rompe esse mutismo. Ela nos interpela, nos chama ao encontro e nos oferece a possibilidade de responder, de nos abrirmos ao diálogo e à transformação. Foi nesse espírito que, na Semana Universitária 2024 da Universidade de Brasília, refletimos sobre a Cosmovisão de um Presente Sustentável na Literatura, um convite para pensarmos na palavra escrita como um instrumento de escuta e interpretação do mundo. Como a Literatura reverbera através das eras e se mantém viva na memória coletiva? Como ela pode restaurar pontes em que o silêncio se instalou? Essas questões foram ampliadas no evento 70 anos de “O Senhor dos Anéis”, celebrado na Embaixada do Reino Unido, onde revisitamos a jornada de Tolkien, para além de um marco literário, como caminho de contemplação e encontro. Assim como Frodo e Sam seguiram pelo vasto mundo da Terra Média, guiados não apenas pelo destino, mas também pela amizade e pelo desejo de restaurar a harmonia, a Literatura nos conduz por trilhos e jornadas de descobertas. No evento dedicado ao legado de Tolkien, esse espírito de peregrinação e diálogo se fez presente, reforçando a Literatura como força capaz de conectar tempos, espaços e pessoas. A obra de Tolkien, assim como tantos textos que ecoam ao longo dos séculos, nos ensina que não estamos sozinhos na travessia – cada narrativa lida, cada palavra compartilhada é uma chama que ilumina o caminho para aqueles que virão depois. Essa busca pela palavra, pelo encontro com o outro e pelo sentido das coisas é um percurso que atravessa culturas e tradições. Como nos lembra Umberto Eco: “A verdade, antes de face a face, manifesta-se por traços (ai, quão ilegíveis) no errar do mundo, de modo que devemos decifrar-lhe os sinais fiéis, mesmo onde nos parecem obscuros ”. A Literatura nos coloca exatamente diante desse desafio: decifrar os vestígios do mundo e dar-lhes novos significados. Assim como os monges de “O Nome da Rosa” buscavam interpretar os fragmentos da verdade ocultos entre as sombras do tempo, nós também somos desafiados a escutar os ecos da Literatura, a perceber os fios que ligam passado e presente, tradição e inovação, palavra e silêncio. Este livro, que nasceu tanto da 1ª Rodada de Comunicações – Semana Universitária 2024 quanto do evento dedicado ao legado de Tolkien, não pretende ser um ponto final, mas um convite ao diálogo. Mais que um registro acadêmico, ECOS LITERÁRIOS é uma chama acesa, que se prolonga nas leituras futuras e naqueles que encontram na Literatura espaços de reflexão e transformação. Que estas páginas não sejam apenas um arquivo de ideias, mas um chamado à escuta e à palavra, à reflexão e à resposta. Que ecos literários continuem a ecoar, e que cada leitura seja um novo encontro. - Cássio Selaimen Dalpiaz - Mestre e Doutorando em Literatura Comparada pela Universidade de Brasília.