MATEMÁTICA EM CENA: APRENDIZAGENS COM LUDICIDADE, CRIATIVIDADE E ALEGRIA

Abstract

Foi com grande satisfação que recebi o convite para prefaciar o livro Matemática em cena dos nossos colegas Alvarito e Dora. Em primeiro lugar, pela proximidade da investigação relacionada às pesquisas que desenvolvo há mais de vinte anos, que defendem as atividades lúdicas como possibilidades pedagógicas no ensino e na aprendizagem da matemática escolar. Em segundo lugar, pela possibilidade de conhecer um trabalho de pesquisa que envolve um projeto interdisciplinar e que efetivamente busca articular a Matemática à linguagem teatral e às vivências e formas de se fazer teatro na escola. Considero esses dois aspectos fundamentais para a pesquisa e a prática sobre o lúdico na Educação Matemática. As pesquisas que envolvem o lúdico na Educação Matemática quase sempre apontam o uso de jogos e brincadeiras infantis em aulas de Matemática. Dentre os vários tipos de jogos explorados nas pesquisas, o foco se insere nos jogos de tabuleiro ou digitais na formação e desenvolvimento de conceitos matemáticos. Para além da formação dos conceitos, reconhece-se a importância de se proporem atividades lúdicas no sentido de motivar os alunos à aprendizagem matemática. Entretanto, o uso de atividades lúdicas não pode ser restrito a esse caráter puramente motivacional. Espera-se que tais atividades possam ser reconhecidas como recursos didáticos, contribuindo para a compreensão, aprendizagem e significação de tópicos do conteúdo escolar que nem sempre se evidenciam de fácil aprendizagem. Por outro lado, reconhece-se o caráter lúdico que necessita ser mantido e que possibilita pensar no jogo com um fim em si mesmo, cujo objetivo é a própria ação de fazê-lo, por isso, atividade lúdica. Dessa forma, os recursos didáticos podem ser explorados de forma a respeitar a ludicidade presente nos diversos tipos de jogo, mesmo em uma situação tutelada como a escolar. Os jogos teatrais se apresentam pouco explorados nas aulas de Matemática ou mesmo nas pesquisas que envolvem o lúdico na Educação Matemática. Dessa forma, reconheço o ineditismo desta publicação e a sua grande importância para a pesquisa e para a prática escolar em Educação Matemática. Alvarito e Dora fazem referências a algumas dessas pesquisas, mas que pela pouca quantidade já se evidencia que o seu uso tem sido pouco explorado. Por outro lado, algumas experiências são relatadas por professores e pesquisadores que experimentam realizar o que alguns chamam de “teatrinho” na escola. Entretanto, em muitas dessas experiências o que notamos é uma ligeira aproximação do que seja uma produção teatral, principalmente se essa não é acompanhada por um profissional que conheça a produção teatral. Entendo que o trabalho apresentado neste livro, Matemática em cena, oferece possibilidades importantes para se repensar as práticas e a pesquisa com o uso do teatro em aulas de Matemática, bem como oferece possibilidades de se pensar em um projeto interdisciplinar envolvendo os professores de Artes, de Matemática e de Língua Portuguesa, e os alunos. O professor de Artes contribui com o conhecimento sobre a produção teatral, os jogos e a linguagem envolvidos; o professor de Matemática contribui com os conhecimentos matemáticos possíveis e desejados de serem explorados, colaborando na construção do roteiro; e o professor de Língua Portuguesa colabora na produção do texto no gênero peça de teatro e os alunos participam de toda a produção, sendo orientados pelos professores. O que está presente na concepção do projeto interdisciplinar é a possibilidade de antecipação, de planejamento de algo a ser concretizado...um desejo. E para que esse desejo seja concretizado a colaboração dos diferentes participantes se faz necessária. Estas são as experiências apresentadas neste livro: o movimento de produção e colaboração de professores e alunos na produção das peças de teatro. Na perspectiva interdisciplinar, é a colaboração que possibilita a construção de um novo projeto que não seria possível ser construído de forma isolada. Nesse aspecto, em projetos interdisciplinares, todos aprendem...alunos e professores envolvidos. Os textos das peças apresentadas na segunda parte do livro evidenciam uma abordagem diferenciada dos conteúdos do currículo de matemática escolar, tanto do ponto de vista da concepção da própria Matemática e de sua articulação com a arte, como na peça A feliz união de Seu Teatro com Dona Matemática, quanto na peça Vaidades geométricas que trata dos conteúdos relacionados à geometria euclidiana plana, de forma divertida e, ao mesmo tempo, rigorosa conceitualmente. O envolvimento e a participação previstos da plateia dão um tom de imprevisibilidade, que é acentuado pela participação dos alunos também como assistentes das peças. Por outro lado, uma prática destituída de teoria tem pouca contribuição para as reflexões e compreensões acerca da matemática escolar. As reflexões teóricas que subsidiam as práticas propostas neste livro são brilhantemente tratadas na primeira parte da obra. Alvarito e Dora assumem as concepções de Educação Matemática na perspectiva da relação entre teoria e prática de D ́Ambrosio, com foco no desenvolvimento de projetos e de uma matemática experimental; a importância da vivência (perejivânie) em Vigotski tendo a arte, o teatro como possibilidade de se criar uma zona de desenvolvimento iminente para adolescentes; e os modos de se fazer teatro em Brecht, que valoriza o papel didático do teatro como uma possibilidade de ensinar às pessoas uma postura crítica e ativa em relação ao mundo. Entendo que as reflexões produzidas na primeira parte do livro representam uma construção teórica importante para conceituar e sustentar a pesquisa com o Teatro como uma atividade lúdica na educação matemática escolar. Quem ganha com essa publicação, certamente, são os professores que ensinam Matemática, que podem se inspirar no trabalho aqui apresentado e propiciar momentos lúdicos de aprendizagem matemática escolar, principalmente para os jovens e adolescentes que, muitas vezes, deixam de se empolgar com as descobertas e produções matemáticas. Aproveitam também os alunos que podem experimentar vivências matemáticas por meio da expressividade artística e se descobrir em meio ao jogo teatral, como um possível personagem da história, um ator, um narrador, um produtor, um roteirista, um figurinista e tantos outros personagens envolvidos no jogo teatral. Finalmente, ganha a pesquisa em Educação Matemática que tem o foco no uso de recursos didáticos na prática pedagógica do ensino e da aprendizagem matemática, com um trabalho de pesquisa que toma a prática escolar como espaço de investigação e a articulação Matemática e Teatro como possibilidade de teorização dessa prática.